segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Ser e não ser, qual a sua questão?


Paradoxos perdem seu valor quando resolvidos. Ouvi essa frase há pouco tempo quando me descrevia como uma eterna contradição, um paradoxo em busca de solução. Também ouvi falar do princípio da incerteza - promulgado por Werner Heisenberg – preceito que manifesta o que pode ser e o que não pode ser. Então, quando Shakespeare questiona: “Ser ou não ser, eis a questão”, atrevo-me a discordar dele. Sempre acreditei nessa indagação. No entanto, tenho refletido que podemos ser e também não ser. Somos incertos, um pouco oito e um tanto oitenta. Somos um S dançando em curvilíneos movimentos. Somos a esquina e a calçada. Somos a parada e o seguir. Somos o verbo e o predicado. E nessa brincadeira, perde-se o sujeito... sim, sou uma contradição. Dessas bem grandes! Ao menos, tenho uma única certeza dentro desse caldeirão de incertezas: sou e não sou. Muito prazer. E qual a sua questão?

domingo, 12 de dezembro de 2010

Decisões de Morfeu



Decidir morrer. A decisão da morte é o caminho daqueles que, simplesmente, não encontram caminhos. Hoje, tenho a certeza indubitável da falta de esperança na vida. O cotidiano massacrante, autofágico em sua insensatez. Perder a tal fé - que muitos alimentam para sustentar uma realidade menos dolorida e mais fantasiosa – vale a pena? Minha fé transpassou por todas as vertentes imagináveis, do candomblé e da umbanda, até sinagoga, protestante e terapia do amor na igreja evangélica. Não reclamo de falta de amor, já que este nunca foi meu objetivo de vida. Muitos dizem que a fé reacende com um grande amor ou com uma religião. Pois bem, nada disso funcionou, nem mesmo as famosas tarjas antidepressivas. Reivindico um mundo. Reivindico simplicidade no viver. Anunciam por ai minha dureza para com o mundo e comigo mesma, mas cheguei à conclusão deste comportamento: uma mera (e esperada) reprodução dos movimentos externos. Sinto o peso da injustiça em meus ombros. Sinto o peso da desigualdade em minha coluna nada esguia. Sinto as dores cotidianas de um suicida. O que ainda me mantém viva nesse mundo? Claro que sou eu, mas por que ainda insisto? Talvez pela curiosidade do porvir, pela animosidade de fazer parte de alguma mudança, pelo amor que sinto pelos meus próximos. Sentia-se fraca, quase a desmaiar em calçadas lavadas por bêbadas em desalento. Parada em uma banca de jornais, não encontrava explicação ou razão para viver. Em um ato mais do que generoso, compartilhando da loucura e da insanidade coletiva, jogou-se. Atirou-se como pedrinhas ao lago. Tão suave que quase ninguém ouviu seu mergulho aquém vida. Enfim, sentia-se viva e teve seu último pensamento às vistas do asfalto: “Um ato singelo pode calar as dores e trazer à tona a simplicidade tão sonhada - muito melhor do que morfina”. Sim, obrigada. Caíra na eternidade dos braços de Morfeu.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A Lapa é assim

A Lapa é assim. Algo inexplicável, talvez sensorial. Saias apregoam contra a gravidade. Moicanos contrastam com penteados crentes. Pernas doídas convalescem nas esquinas. Fomes são esquecidas. Ao lado do forró, dance até o chão com o batidão do funk, ou então siga pela Mem de Sá num bloco improvisado de carnaval. A Lapa é assim. Palmeiras de acolá com ervas de outras escadarias. Reggae além da medida no churrasquinho da esquina. A Lapa é assim. Gelada como o chopp do botequim. Solitária como a feira dos arcos. Sufocante como a fila dos shows. Destilada como a batida de quinta da barraca da tia Neide, que nem sei se existe. A Lapa é assim. Sincretismo fervoroso, São Jorge sobre nós e lama sob nós. Somos o bueiro mais diversificado e mais cobiçado deste Rio de Janeiro. A cada esquina uma nova roda, um novo ritmo, um novo cheiro de cigarro, uma nova cerveja e até uma nova cantada. A Lapa é assim. O buraco arqueado mais excitante de todas as contradições existentes. A Lapa é assim.

11 de dezembro
- Bumbum de passista de samba é feito de laquê;
- Cerveja é bom e todo mundo gosta;
- Gringo inventa uma dança que ninguém entende;
- A Lapa é clandestina...

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

e deus?

Tinha pensamentos lúdicos com o cotidiano. Acordara em uma manhã ensolarada blasfemando:
- Deus é muito filho da Puta. Como ele permite essa miséria humana?!

Claro que seu deus a castigou e fez o sol arder sobre seu corpo, fez sua pressão cair e suas mãos formigarem. Sim, deus era vingativo. deus é daqueles caras que guardam mágoa, que esperam o dia apocalíptico para prestar contas e ranger seus dentes raivosos. deus lhe foi tão filho da puta, que se masturbava sobre nuvens celestiais à espreita do canibalismo existencial.
- Ai, meu deus, vou morrer. Desmaiar bem aqui, no meio do aterro do Flamengo. Ai, deus, arranca esse sofrimento de mim.
deus: assistia seu futebol dominical coçando o saco, como de costume.
Escrevera sua carta. Seu testamento. Dou-me morta. Morta para mim. Morta para esse mundo. Eu sou morta. Eu estou morta. E deus? Sorriu com a carta fúnebre deixada dentro da geladeira...
09 de janeiro
- Ar-condicionado de quitinete é porta da geladeira aberta;
- Brincar na fila do poste é nostálgico;
- Ter com quem contar é maravilhoso;
- Ficar sem Prozac e afins não é uma boa ideia;
- Chuva de verão é excitante.

Cuspo


Muitas coisas são difíceis de explicar. Outras mais ainda de sentir. Explodo. Canso. E cuspo. Nada disso tem valor. Ainda prefiro minha nova cabeleireira de R$20 e meu all star velho.

Cristianismos baratos


Segurar um neném nos braços é um sopro de vida. Nunca pensei em ser mãe, mas ter um bebê no colo, tão pequenino, indefeso, me alimentou o desejo maternal. Não sei se daria conta de um próprio, mais provável um adotado. Não sei se lido bem com essa vaidade humana em ter um ser à semelhança. Basta de cristianismos baratos. 

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Sexta-feira de Jeová

Sou tia! Motivo pelo qual me ausentei deste testamento cotidiano há alguns dias. Algo que não posso deixar de relatar é o episódio de sexta-feira. Saio de casa com minha mochila rumo a Campinas, chamo um taxista que pergunta:

- "Você vai para muito longe?"
Respondo que não e, então ele pede que eu me sente no banco da frente, pois atrás estava carregando coisas pessoais.

Sentei-me e descubro que somos praticamente vizinhos. Ele espeta em seu som um pen drive e me mostra sua segunda profissão e hobby: a música. Ele nos teclados e na voz:

- "Jeová, Jeová"

R$15, para você faço por R$10, quer?

Finito.
 

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Bonequinha de luxo


Vem e me come da cabeça aos pés. Quero firmeza em suas ações e não mais meros predicativos de um sujeito. Essa miséria em cantos quaisquer espanta beija-flores de um amanhã. Vem e me come da cabeça aos pés. Tenho fome e quero engolir teu estômago que assiste a toda esta miséria cotidiana. Não tenho mais pena de sorrisos blasés. Desprezo convenções e conveniências. Vem e me come da cabeça aos pés. Ignoro aqueles que assistem de quatro a violência despudorada deste mundo desigual. Não gosto de simetria, muito menos de padrão. Ainda não concebeu entre pernas a dignidade. Nunca pediu muito. Rezava todos os dias, mantinha a dignidade e queria a clareza e a coragem de um belo e sonoro NÃO. Vem e me come da cabeça aos pés. É assim, com plena covardia, que me domina, me cerca e me cerceia. Gritos não significam desejo. E, sim, indignação. Vem e me come da cabeça aos pés. Jamais serei sua. Jamais serei de ninguém. Jamais serei propriedade de outrem.
02 de dezembro
- Sexo dominação engana;
- Masturbação intelectual funciona;
- Comida pronta faz mal e pronto;
- Colo de mãe dá saudade

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Corpo morto


Sinto-me morta. Estas não são memórias póstumas, raríssimo leitor, e sim, memórias de um hoje não tão distante. Memórias de um corpo sem ar. Apenas coração. A vida lhe parecia tão sem graça, tão imperativa, tão certa de primeiras e terceiras pessoas. Será a morte mais divertida? Quiçá mais excitante? Cansava-se de tudo. Das pessoas. Das futilidades. Das humilhações. Das mágoas. Dos preconceitos. Das indignidades. Das baixarias. Cansava-se e tragava, a cada dia, um belo cálice de niilismo. Sua principal fantasia. Enrolava-se e rolava na grama ainda úmida. Uma grama fértil entre cruzes. Preferia os quadrantes, embora fossem caretas. Blergh! Odiava caretices e ostentava libertação. Sinto-me morta. Confusa entre meus eus. Já não havia mais respiração. Apegava-se a crenças tolas, que pudessem, minimamente, afirmar sua falsa fé. Não acreditava em nada, nem em si mesma. Sinto-me morta. Ainda não decifrei o porquê de pessoas com fé serem mais felizes. Talvez não tivesse fé. Afinal, era mais uma perdida, uma errante filha de Caim. Sinto-me morta.
01 de dezembro
- Um ombro amigo faz falta;
- Dignidade fala mais alto;
- A morte é uma boa preferência;
- Esperava cuidado de seu grande amor;
- Decepções rodeiam;
- Curau de milho do centro da cidade é irresistível;
- Quanta gente à beira de um surto...